Ao contrário da imagem que temos hoje da energia solar, o protótipo de Shuman era algo mais modesto (Imagem: Historia.net)
Em um tempo em que as grandes invenções eram movidas a carvão e vapor, imaginar que um dia poderíamos converter a luz do sol em energia, seria loucura. Mas Frank Shuman, em agosto de 1897, ao lado de uma lagoa em sua propriedade, apresentou ao mundo uma pequena máquina movida por energia solar. E essa era apenas a primeira etapa de uma ambição que alcançaria o deserto egípcio e quase mudaria o futuro da humanidade.
Ao contrário das imagens fantásticas que hoje associamos à energia solar – com painéis fotovoltaicos reluzentes e usinas quilométricas –, o protótipo de Shuman era algo muito mais engenhoso e, ao mesmo tempo, modesto. Ele usava caixas cheias de éter, um líquido altamente volátil com um ponto de ebulição mais baixo que a água, para captar o calor do sol. O processo era surpreendentemente simples: espelhos refletiam os raios solares em caixas que continham tubos, aquecendo o éter e transformando-o em vapor. Esse vapor, então, alimentava uma pequena máquina, que operou sem parar durante dois anos.
Mas Shuman não parou por aí. Ele sabia que, para dar o próximo passo, precisava de mais potência e de um combustível mais barato. Ao lado de Sir Charles Vernon Boys, um renomado físico britânico, ele aperfeiçoou seu sistema, substituindo o éter pela água e desenvolvendo uma turbina de baixa pressão, que poderia processar o vapor aquecido pelo sol de maneira quatro vezes mais eficiente do que as máquinas da época. Em 1908, fundou a Sun Power Company, e dali em diante, estava determinado a levar sua invenção ao próximo nível. A energia solar se tornava, pouco a pouco, mais que uma curiosidade científica. Ela se tornava uma promessa.
A jornada o levou ao Egito, onde ergueu a primeira usina solar térmica do mundo. Imagine a cena: um campo no deserto egípcio, onde espelhos parabólicos gigantescos concentravam a luz em caldeiras de ferro fundido. Cada calha refletiva, com 62,5 metros de comprimento, seguia o movimento do sol, captando o máximo de energia possível. No coração desse sistema estavam as caldeiras, envoltas em vidro, criando um efeito estufa que mantinha a água quente o suficiente para gerar vapor. E, como em um espetáculo de engenharia, o vapor era direcionado para uma máquina, também a vapor, que gerava entre 50 e 60 cavalos de potência.
Essa potência movia uma bomba com a capacidade incrível de elevar 22.712 litros de água por minuto do Nilo até os campos de algodão ao redor. Pela primeira vez, a energia do sol era convertida em um sistema de irrigação em pleno deserto, sem nenhuma ajuda de combustíveis fósseis. O vapor gerado se condensava e voltava para as caldeiras, criando um ciclo sustentável e repetitivo. Frank Shuman tinha transformado o sonho da energia solar em uma máquina real e funcional.
Mas o que aconteceu com essa invenção? Infelizmente, a visão de Shuman foi esmagada por um oponente que ele jamais poderia prever: o petróleo. Com a Primeira Guerra Mundial e a descoberta de petróleo abundante e barato nos anos 1930, a ideia promissora de Shuman foi abandonada, suas máquinas deixadas para enferrujar sob o mesmo sol que ele tanto ansiara aproveitar. Sua ideia permaneceu esquecida, quase apagada pela ânsia por combustíveis fósseis.
Foi apenas na década de 1970, em meio à crise energética global, que a visão de Shuman ressurgiu. Em 1916, ele já profetizava, em uma entrevista ao The New York Times: “Provamos o lucro comercial do poder solar nos trópicos e provamos mais particularmente que, depois que nossas reservas de petróleo e carvão forem exauridas, a raça humana poderá receber energia ilimitada dos raios do sol.” Seu aviso não foi ouvido na época, mas seus métodos e sonhos influenciaram diretamente os sistemas solares modernos que hoje se espalham pelos desertos e campos.
A história de Frank Shuman é um lembrete de que o futuro da energia esteve, desde sempre, sobre nossas cabeças, iluminando nossos dias. Hoje, suas ideias ecoam na mente de cientistas e engenheiros que buscam uma nova era energética. Em um momento onde a busca por energias renováveis nunca foi tão urgente, o sonho de Shuman vive como uma promessa de que, um dia, talvez possamos voltar a olhar para o sol como ele olhou, acreditando que ali há uma fonte inesgotável de vida e de poder.